Na real

Há muito tempo deixei de falar mais, para ouvir mais. O falar, todo mundo fala, 'entorpecidos' pelos absurdos diários que presenciamos, ouvimos, assistimos...É difícil hoje ralentar o tempo com qualidade e contemplação, porque nossos olhares estão saturados, e nossos sentidos numa vertigem, que ao invés de nos empurrar para transgressão, ou seja para mudança, nos 'paralisa' e confunde. Mudança, digo, desta complexa realidade, cheia de interesses políticos, onde toda partilha do sensível é negociada, condicionando corpos, ceifando vidas, invisibilizando traços. Não é a toa que nossa cara brasil, os rostos latinos americanos (que somos) são vistos com estranheza, como dizia a boliviana Domitila Chungara: "Somos projetados pelos meios de comunicação como o mal, o maldito, o drogadito. Então a gente começa a ter vergonha de nós mesmos." Acho que a questão é: perceber, reaprender a olhar, falar, mas falar menos e agir mais, esse agir não apenas como práxis - um trabalho repetitivo e monótono, mas sim um fazer poiesis, uma ação que desvenda, que cria, transforma...em busca de uma prática criativa para nossa falta de projetos para sociedade e para todas as esferas sociais que estão em crise (sim ruímos, mas o novo sempre vem). Devemos reconhecer as ruínas do passado, que nos são simbólicas (pelo moderno que já foram um dia), mas também temos de ter clareza acerca do jogo do presente, conflituoso e desagregador, que só pode ser combatido, quando nossos jovens puderem estimular seus potenciais, ser quem são, serem introduzidos com dignidade na vida 'adulta', com acesso, com inclusão, com oportunidades para TODOS, não é assim que se chega em um Estado de bem-estar social? Falta atitude entre tanto corpo mole. Falta a visão de que são os jovens que trazem o lúdico, que movimenta a pulsão da vida de uma sociedade, que podem também dialogar e prezar por um todo intergeracional, intercultural, onde as diferenças são as diferenças, não apenas assimiladas, mas vistas como alteridades desejantes. Muniz Sodré diz que o ser humano pensa que conhece o outro quando compara e distingue a diferença, só que não, porque distinguir, não é conhecer, somos ótimos em rotular e ser o detentor da verdade.... Será que daqui que surgem os preconceitos? Pois bem, venho reapreendendo que enquanto há vida, existe tempo para tudo. Venho reafirmando que não podemos fazer de nossas vidas, a vida que QUEREM que a gente faça. Venho desconfiando de que cada esfera social poderia estar em 'harmonia' e não uma subjulgando a outra, porque são esferas, subsistemas ao molde da brilhante e catastrófica modernidade, agora o sistema, bem como o todo, meus caros, deve ser para muito além disso, e me interessa.


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